Science Spain , Burgos, Tuesday, May 03 of 2011, 11:05

Mandíbula encontrada em Sima del Elefante pertence a uma espécie indeterminada

Pesquisadores do Cenieh trabalham agora com três hipóteses taxonômicas para o fóssil: trata-se do ‘Homo antecessor’, ‘Homo georgicus’ ou de uma nova espécie

Antonio Martín/DICYT O rastro do europeu mais antigo, a mandíbula que mudou a pré-história, tem novidades. Quando foram descobertos em Sima del Elefante, na jazida de Atapuerca (Burgos), atribuíram-se os restos ósseos de forma “provável” à espécie Homo antecessor. Agora seus descobridores, os pesquisadores do Centro Nacional de Investigação em Evolução Humana (Cenieh), aprofundaram nessa atribuição. O fóssil pertence a uma espécie indeterminada, mas os cientistas trabalham com três possibilidades: que seja efetivamente um Homo antecessor, que seja um Homo georgicus, pouco conhecida, ou que pertença a uma espécie nova que estabeleceria um novo elo na cadeia evolutiva.

 

José María Bermúdez de Castro, co-diretor da jazida de Atapuerca, apresentou na quinta-feira 28 de abril, em Burgos, os resultados de uma pesquisa mais aprofundada sobre a taxonomia desta mandíbula. O artigo que reúne estas conclusões foi publicado no último número do Journal of Human Evolution, a revista mais importante do setor. No momento da descoberta, publicada em março de 2008 na Nature, na que foi imagem de capa, “faltavam estudos detalhados” para determinar sua afiliação. Naquele momento, de maneira provisória, considerou-se que pertencia ao Homo antecessor. O fóssil tem entre 1,2 e 1,3 milhões de anos. A equipe de Paleobiologia dirigida por Bermúdez de Castro procurou, desde então, realizar um estudo completo sobre a morfologia dos restos ósseos.

 

Apesar das sofisticadas técnicas utilizadas, os cientistas necessitam “mais informação” para determinar a se esta mandíbula pertenceu realmente à espécie Homo antecessor. Por este motivo, os pesquisadores do Cenieh consideram agora três hipóteses: que seja efetivamente desta espécie, que os restos sejam do Homo georgicus, uma espécie de hominídeo pouco conhecida que, como antecessor, situa-se entre o Homo habilis e o Homo sapiens, ou que representem os primeiros restos de uma nova espécie da cadeia evolutiva humana. Entre as técnicas usadas estão tecnologias como o microscanner, que permite varredura em micras (mil vezes menor que um milímetro). Através deste scanner foi possível reconstruir “com uma fidelidade incrível” a dentadura que abrigou esta mandíbula.

 

Os restos de Sima del Elefante encontram-se cronologicamente entre os restos mais conhecidos de Homo antecessor e Homo georgicus. No primeiro caso, os fósseis encontrados em Gran Dolina, também em Atapuerca, marcam a presença desta espécie na Europa ao redor de 900.000 anos atrás. Da jazida georgiana de Dmanisi (daí o nome Homo georgicus) foram recuperados os restos da outra espécie com uma antiguidade de 1,8 milhões de anos. Estes fósseis tiveram, reconhece Bermúdez de Castro, “pouco acolhimento e inclusive foram ignorados” por parte da comunidade científica internacional. Os cientistas do Cenieh querem agora definir qual das três opções é a correta caso consigam descobrir novos fósseis em Sima del Elefante do mesmo indivíduo ao que pertenceu a mandíbula ou de algum contemporâneo dele.

 

De qualquer forma, pertencendo a uma ou outra espécie, para Bermúdez de Castro está claro que a população européia a que pertencia este primeiro habitante do continente “estava estabelecida e já havia perdido parte de sua identidade africana”, constituindo a primeira linhagem européia. Os pesquisadores querem saber agora de quantas espécies é composta esta linhagem, “que pode ser uma ou três, mas não mais, porque não houve tempo material” para que ocorresse mudanças tão rápidas.

 

Novo enfoque evolutivo

 

A interpretação dos restos levou os responsáveis do Cenieh a propor um novo cenário evolutivo diferente do apresentado em muitos museus de história natural. Para Bermúdez de Castro, a árvore evolutiva que mostra as mudanças nas espécies de forma seqüência não é “muito biológico”, já que não leva em conta alguns fatores externos que provavelmente influenciaram na evolução humana. A nova idéia é “mais dinâmica” e considera a existência de “populações móveis que chegaram a colonizar a Europa em diferentes pulsos migratórios” quando tinham a favor certos fatores climáticos.

 

Este ponto de vista considera que existiram três fatores que influenciaram a evolução humana: o ecossistema, o clima e a geografia. Com respeito ao primeiro, Bermúdez Castro lembra que a Paleologia mostrou que diferentes espécies de vertebrados realizaram movimentos migratórios no passado e, portanto, para encontrar um ecossistema adequado para o seu desenvolvimento, o ser humano teve que se deslocar também. O clima, ademais, variou muito no último milhão de anos, o que permitiu a mobilidade dos hominídeos. Um terceiro fator é o geográfico. “As grandes montanhas não puderam ser atravessadas até pouco tempo atrás, de maneira que o ser humano se deslocava utilizando os cursos dos rios; um exemplo são os assentamentos encontrados na planície do Danúbio”.

 

De forma paralela ao estudo morfológico da mandíbula e à publicação dessa nova explicação, o último número do Journal of Human Evolution aceitou outro artigo de uma equipe do Cenieh. Este segundo texto, cuja autora principal é María Martinón-Torres, responsável do Grupo de Antropologia Dental, descobriu as patologias das que padeceu o primeiro europeu. “Ele deve ter sofrido muito”, resumiu Bermúdez de Castro. Os pesquisadores observaram desgastes nos dentes molares, dentes espaçados e para fora e inclusive quistos. Os cientistas atribuem a este indivíduo uma idade entre 30 e 35 anos.