Centro de Lasers Pulsados Ultracurtos Ultraintensos adentra as fronteiras do conhecimento
José Pichel Andrés/DICYT O Centro de Lasers Pulsados Ultracurtos e Ultraintensos (CLPU) de Salamanca caminha a passos gigantes. Seus cientistas acabam de mudar-se ao Edifício M3 do Parque Científico da Universidade de Salamanca e, ainda que somente seja uma sede profissional, espera-se que em poucos meses tenham sua sede definitiva e que em 2014 comecem a operar o laser petawatt (bilhões de watts), uma infra-estrutura quase única no mundo. Quando for estreada, ainda não haverá mais de dez instalações de alta tecnologia como esta no planeta.
No entanto os pesquisadores não estão de braços cruzados esperando por este momento, ao contrário disso, como pela primeira vez a Espanha se destaca no desenvolvimento de uma alta tecnologia, para poder aproveitar esta vantagem competitiva os cientistas já estão trabalhando em linhas experimentais e teóricas que terão grande relevância com o futuro laser.
A principal característica deste tipo de laser é que pode concentrar alta quantidade de energia em um breve espaço de tempo. Por isso se fala de pulsos de luz “ultracurtos” e “ultraintensos”. Ricardo Torres, chefe da Área Científica do CLPY, explica que uma das vantagens desta tecnologia é estudar a Física de attosegundos. “Os elétrons, que determinam as propriedades da matéria e suas transformações movem-se a velocidades incrivelmente rápidas. Para estuar seu movimento são necessárias câmeras com um tempo de obturação muito curto, já que, do contrário, a foto (a informação obtida) sairia embaçada. Neste caso a câmera é um pulso laser. Com os lasers de alta intensidade que possuímos atualmente é possível gerar pulsos que duram poucos attosegundos (correspondente a um bilionésimo de um bilionésimo de um segundo), o que possibilita observar o mundo subatômico em câmera lenta. Com estes lasers estamos literalmente explorando um mundo totalmente novo e desconhecido”, agrega.
Definitivamente, “é como um flash que nos permite ver como acontecem as coisas em um tempo muito reduzido”, comenta Camilo Ruiz, um dos pesquisadores que trabalham com Física de attosegundos. De fato, estes pequenos pulsos de luz são “o menor evento artificial existente no mundo”. Apesar de o laser de petawatt ainda não estar disponível, os cientistas do CLPU que trabalham neste campo já realizam experimentos. Atualmente, contam com um laser de 20 terawatts (um terawatt refere-se a um trilhão de watts) que já é o mais potente da Espanha e no mês de abril poderão contar com um laser de 200 terawatts, a quinta parte da potência que ao final será instalada.
Propagação não linear da luz
Outra questão já pesquisada com a tecnologia atual é a propagação não linear da luz. Geralmente a propagação da luz depende das propriedades do material pelo qual passa, como o ar ou a água. No entanto, “nas altas intensidades criadas por nossos lasers a luz modifica as propriedades óticas do material ao mesmo tempo em que se propaga por ele”, afirma Ricardo Torres. É o que se conhece por “propagação não linear”, que tem enormes possibilidades de aplicação.
A mais interessante está voltada às comunicações óticas, ou seja, à transmissão da informação através da luz. “É o futuro das comunicações”, afirma David Novoa, cientista do CLPU que estuda questões mais teóricas. “A eletrônica está atingindo seu pico em relação à velocidade de processo, assim que no futuro prevê-se a integração de circuitos mistos entre eletrônica e ótica, ou de circuitos totalmente óticos, nos quais a informação viaja codificada nos fótons (partículas de luz) e não através dos elétrons”, afirma. Ainda que este tipo de tecnologia já seja realidade sem a intervenção de potentes lasers, “a utilização de pulsos de luz poderia transmitir a informação sem repetições, porque não sofreriam mudanças enquanto se propagam”.
Aceleração de partículas
Em outros campos do conhecimento em que acontece algo parecido, a tecnologia do laser de petawatt pode representar um grande impulso. Por exemplo, a aceleração de partículas como elétrons, os prótons e os íons, um terreno em que os especialistas tem muitas esperanças, já que possui uma grande gama de aplicações. Algumas das mais destacadas relacionam-se com a Biomedicina.
“Com os lasers podemos acelerar prótons que poderiam ser utilizados em breve para um novo tipo de radioterapia que cure, por exemplo, os tumores do cérebro. Na radioterapia normal a radiação o destrói completamente, mas com esta inovação poderíamos atuar somente na região do tumor”, afirma Camilo Ruiz. De fato, esta terapia com prótons já está estabelecida, mas os lasers intensos podem ajudar a entender melhor o processo para que a tecnologia necessária evolua para otimizar as terapias.
Mais futuro no laser do que no LHC
Por outro lado, existe um campo do conhecimento no qual, de momento, somente se trabalha de forma teórica até que o laser atinja sua intensidade máxima: a Física do vácuo. Neste aspecto se atingem atuais fronteiras do conhecimento, porque ninguém realizou ainda experimentos. A idéia é que concentrar uma energia extrema no vácuo poderia produzir partículas nas quais não estão presentes, o que representaria “transmutar energia em matéria”, explica David Novoa. Estes experimentos seriam transcendentais para a física, porque se forem criadas novas partículas através deste procedimento, as teorias atuais seriam confirmadas, mas comprovar que isto não acontece faria com que muitos fundamentos desta ciência fossem repensados e, portanto, representaria um grande avanço.
É algo muito semelhante ao que está acontecendo no LHC ou Grande Colisor de Hádrons do Laboratório Europeu de Física de Partículas (CERN), cujos cientistas procuram o bosón de Higgs para certificar ou refutar determinadas teorias. No entanto, nesta busca de novas partículas os especialistas vêem mais futuros no desenvolvimento de grandes lasers. “Muitas partículas provavelmente não poderiam ser observadas no LHC, e sim em lasers de alta potência que continuarão evoluindo nos próximos anos, enquanto é provável que nunca se construa um acelerador maior que o do CERN”, comenta David Novoa.
Outras questões como o processamento de micro e nanomateriais, ou as medidas de radioproteção neste tipo de instalações, também serão objeto de estudo. O futuro está aberto a muitas possibilidades, mas Salamanca já tomou a dianteira na tecnologias dos lasers.
O grande projeto europeu ELI no horizonte
O Centro de Lasers Pulsados Ultracurtos e Ultraintensos é uma das instalações científico-técnicas singulares desenhadas pelo Governo Espanhol. Grandes projetos convidam a realizar “ciência de fronteira” por parte de prestigiados pesquisadores. No entanto, também será um centro aberto a pedidos de usuários que precisem desenvolver nele seus experimentos ou sua tecnologia, especialmente quando esteja pronto o laser de petawatt, mas também atualmente, quando se dispõe de uma potência inferior, mas que possivelmente alcançará a dos lasers mais potentes do mundo.
Dentre as empresas interessadas na opção de pesquisar no CLPU está a Proton Laser Applications, de Salamanca, que considera as possibilidades dos laseres como aceleradores de prótons no âmbito biomédico. Outra companhia está interessada em fórmulas para diminuir o CO2 na atmosfera graças aos lasers, que poderiam romper esta molécula contaminantes. Além disso, um terceiro projeto, que resultou em um acordo empresarial, aposta na geração de um laser de femtosegundo fabricado na Espanha graças à tecnologia que poderá ser desenvolvida no CLPU.
Todas es idéias começam a se materializar agora. O Edifício M3 do Parque Científico da Universidade de Salamanca já possui três laboratórios de experimentos, mas isso só está no começo. De fato, pode ser que o próprio laser de petawatt, que estará no Edifício M5, só represente um passo na instalação de um ainda maior. Assim esperam os cientistas do CLPU, que estão promovendo a candidatura da Espanha para receber a quarta base do grande projeto europeu ELI (Extreme Light Infraestructure). Representaria a construção do maior laser do mundo, que completaria os projetos já desenvolvidos na Hungria, Romênia e República Checa, com uma potência de 100 petawatts. Um sonho que encheria de luz a ciência espanhola.
Nomes e dados
Projeto - o CLPU é uma Infra-estrutura Científica e Tecnológica Singular (ICTS) do Ministério da Economia e Competitividade (antigo Ministério da Ciência e Inovação), da Junta de Castela e Leão e da Universidade de Salamanca. A administração central e regional aportarão, até 2021, quase todo o orçamento, que está em 24 milhões de euros.
Acontecimentos - 2012: Mudança provisional ao Edifício M3 do Parque Científico da Universidade de Salamanca. 2013: Mudança ao Edifício M5 do CLPU. 2014: Começa a funcionar o laser de petawatt.
Linhas de pesquisa - Ciência de attosegundos. Propagação não linear. Aceleração de partículas. Processamento de materiais. Radioproteção.
Conexões Mundiais - O CLPU faz parte de várias redes internacionais: LaserLab Europe, ELI (Extreme Light Infraestructure) y ICUIL (The International Commitee on Ultra High Intensity Lasers).
Responsáveis - Diretor: Luis Roso. Gerente: Pedro García.
Palavras-chave - Laser: do inglês light amplification by stimulated emission of radiation, amplificação de luz por emissão estimulada de radiação. Femtosegundo: milésimo de trilionésimo de segundo. Attosegundo: milésima de femtosegundo ou milionésima de trilionésima de segundo. Terawatt (TW): um trilhão de watts. Petawatt (PW): 1.000 terawatts.